sábado, 20 de setembro de 2014
“Zero risco, zero inovação”
Artigo redigido por António Machado Vaz*
AMV14|2013-14
“Não é o crítico
quem conta. Não é o homem que aponta os tropeções de quem teve iniciativa para
fazer alguma coisa. O mérito é do homem que está na arena, cujo rosto está sujo
de pó, suor e sangue; daquele que resiste corajosamente; daquele que fracassa
uma e outra vez - porque não há esforço sem obstáculos e dificuldades. É ele
quem realmente se empenha para realizar alguma coisa; é ele que conhece o
grande entusiasmo e o grande desgaste de se dedicar a uma causa digna. É ele
que, na melhor das hipóteses, conhece o sucesso e, na pior, se falha, ao menos
falha ousando em grande, para que o seu lugar nunca seja junto daqueles pobres
de espírito que nem gozam muito nem sofrem muito, porque vivem nessa penumbra cinzenta
que não conhece vitória nem derrota.” – Theodore Roosevelt, discurso na Sorbonne (Abril 1910)
Um amigo meu que trabalhou na Unilever contava que, em
tempos, perante a ameaça do lançamento de um detergente melhor pela
concorrência, a empresa resolveu adoptar uma estratégia agressiva de
contra-ataque. A ideia era anteciparem-se e lançarem um produto ainda melhor –
mas, para o fazerem, tinha de agir em tempo-record. Nomearam um tal de Niall Fitzgerald para liderar esse
projecto, que fez o que lhe competia: em muito pouco tempo, a Unilever
conseguiu, de facto, lançar o tal novo detergente no mercado - o Persil com
agentes abrasivos.
Correu mal. A fórmula
funcionava bem demais e, além da nódoa, destruía também a roupa. A empresa teve
um prejuízo de 1,6 biliões de dólares com a aventura.
É caso pra dizer: QUE BURRO! Foi, com certeza, sumariamente
despedido…
Não, não foi.
Mais: meses mais tarde, o CEO da empresa reformou-se e,
quem é que escolheu para seu sucessor? O tal Niall Fitzgerald. Porquê?
Pela forma como Niall encarou o fracasso: minimizando
os custos, recuperando os atrasos e, principalmente, pelas lições que retirou
desse episódio - passando a ter muito mais atenção aos aspectos críticos de
modo a evitar a repetição do erro.
Niall Fitzgerald tornou-se uma lenda no mundo dos
negócios.[1] O seu
principal mantra era que todos os
negócios de sucesso tinham dois componentes críticos e inseparáveis: a inovação
e o risco. “Zero risco, zero inovação” – costumava dizer.
Niall assumia que o papel dos líderes das empresas era tomar decisões e gerir as consequências
dessas decisões – ie, assumir o risco de falhar. “Enquanto o papel da gestão é criar
procedimentos que permitam lidar com a complexidade (conferindo segurança e
previsibilidade), ao líder cabe promover algum caos. Deve criar um ambiente em
que as pessoas sintam que podem assumir riscos.” De facto, a existência de procedimentos é importante. É isso que permite
que não estejamos a questionar tudo a toda a hora. Os procedimentos são o
“piloto-automático” que permite fazer as coisas mecanicamente, com rapidez,
ritmo, padrão, certeza (por isso é que ele existe na aviação). Mas os
procedimentos também são responsáveis pela inflexibilidade
que existe dentro das organizações. Para evoluir é preciso experimentar novas
soluções. É necessário “desligar o piloto automático”. Mas isso implica aceitar
riscos. Claro
que há que estar preparado; rodear-me dos melhores. Mas há também que ter a
consciência que, por muito bem preparados que estejamos, quando se entra em
território desconhecido, os imprevistos vão sempre acontecer. Porque a
realidade é mutável e complexa. Como se costuma
dizer, “na prática, a teoria é outra”. Daí que tenha de haver espaço para o erro. Porque não existe
inovação sem experimentação. O erro faz parte da aprendizagem e do
conhecimento.
Niall Fitzgerald sublinhava que “com o direito a arriscar vem o direito a errar. Ter um cargo de chefia
significa ser tolerante com as falhas, sem usar isso como desculpa para uma má
performance. Um dos chefes que mais me marcaram costumava dizer que quem não
fez erros suficientes devia ser despedido – porque só não erra quem não tenta!”[2]
Em Portugal, os erros pagam-se caro. Ser despedido,
chumbar de ano ou falir uma empresa representa uma mancha de vergonha que será
carregada para o resto da vida. Nunca é encarado como uma experiência valiosa,
necessária para evoluir, para evitar a repetição dos erros. Por isso mesmo, erramos
pouco – e erramos pouco porque
arriscamos pouco. Arriscamos pouco porque não valorizamos o prémio e porque
normalmente este é muito menor do que o castigo do fracasso.[3]
As próprias pessoas escondem os seus insucessos e
desculpabilizam-se. Os despedido dizem-se vitimas duma fractura profissional.
Os chumbados vítimas de uma injustiça do sistema. Os falidos, de um sub-produto
da inexperiência. Apenas sabemos lidar com o sucesso. E por isso preferimos
jogar pelo seguro. Arriscar pouco, para ganhar pouco.
É preciso mudar esta mentalidade. E nisso, as empresas
têm um papel activo a desempenhar. Se uma empresa não aceita
que por vezes pode falhar, então não vai ter colaboradores dispostos a correr riscos
e envolverem-se em projetos inovadores. A inovação são ideias novas em ação.
Por isso, é importante testar e experimentar. Passar à ação, definir projetos
pilotos, limitar o âmbito, controlar e monitorar eventuais danos laterais. Só
conseguimos acertar se conseguirmos falar sobre aquilo que correu mal. Não para
identificar culpados ou ouvir desculpas mas para corrigir erros. Por isso,
incentivar a livre discussão dos erros, diminui os custos, e aumenta a melhoria
continua e a criatividade global da organização.
Nunca se sabe de onde poderá sair a próxima
ideia revolucionária. Por isso, “apoie
o risco. Não se esqueça que todas as pessoas são normais, até que as conheçamos
um pouco melhor”.[4]
* Colaborador nas publicações do Blogue desde Outubro de 2013.
[1] Ao assumir os destinos da Unilever, Niall
Fitzgerald adoptou uma estratégia agressiva de crescimento, assente na
qualidade em vez de na quantidade das marcas representadas. Porque – como dizia o Marechal Foch - aquele que defende tudo não
defende nada. Delineou um plano a
5 anos, destinado a adquirir marcas mais fortes e vender as que tivessem um
valor mais reduzido. No final desse período de 5 anos, a Unilever passou de
1.600 marcas para apenas 400, tornando-se numa organização mais lean e rentável.
[2] Unilever press release, November 21, 2003
[3] Talvez por isso, dedicamo-nos sobretudo a criticar quem teve a coragem
de agir ("eu no lugar dele, tinha
feito bem melhor! Ai se fosse comigo!”). Mesmo sem conhecer as dificuldades
de quem está no terreno, mesmo sem ter experiência suficiente para saber
realmente do que falamos, todos somos "treinadores de bancada". Prova
disso é o número inusitado de comentadores que por aí proliferam.
[4] Jonas Ridderstrale
Postado por Davide Gouveia às sábado, setembro 20, 2014
quinta-feira, 11 de setembro de 2014
Administrando erros e vencendo!¹
Artigo redigido por Davide Gouveia*
DG68|2007-13|14
No dia 31
de outubro de 1996, às 8 horas da manhã, um avião da TAM caiu, 25 segundos
depois de decolar do aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
* Manager do Blogue desde Outubro de 2007.
DG68|2007-13|14
Erros
profissionais não estão nos planos de ninguém. Ninguém imagina que possa errar
um pênalti, muito menos se esse pênalti for na partida final do campeonato. Mas
isso é coisa que acontece e, nessas horas, alguns conceitos de marketing são
remédios muito mais eficazes do que desespero e fuga.

O acidente,
no qual morreram 98 pessoas, tinha todos os ingredientes para quebrar a
empresa. Além da gravidade em si, do número de vítimas e dos danos materiais
causados, era um desastre que caía como uma luva para os interesses da
concorrência e de outras empresas interessadas em se aproveitar comercialmente
da situação. Seria, enfim, um desastre completo.
Seria!
Seria um desastre completo se o Comandante Rolim (presidente da companhia à
época. Falecido em 2001) e sua equipe não estivessem preparados para enfrentar
aquela situação.
Eles agiram
de forma rápida, tomando providências simples, posicionando claramente a
empresa e solucionando os problemas possíveis. Sabiam, por exemplo, que os
parentes das vítimas seriam apresentados na televisão, chorando, mostrando a
fotografia do parente morto e culpando alguém pelo “crime”. Por isso,
prontamente eles “recolheram” o máximo de parentes que puderam em um hotel de
luxo, com médicos, enfermeiros e psicólogos. Com isso eles mataram dois coelhos
com uma só cajadada: providenciaram o atendimento às vítimas (os parentes
também são vítimas) e evitaram todo o terrorismo que teria sido feito na
televisão se os parentes ficassem “soltos”.
Em momento
algum deixaram de informar à imprensa sobre o que estava acontecendo. Todas as
ações foram rápidas e coordenadas. Parece até que eles estavam treinados para
enfrentar uma catástrofe daquela envergadura.
Parece? É
claro que estavam treinados! Uma empresa cuja atividade convive diariamente com
o risco de acidentes graves precisa estar preparada para administrar os
problemas causados por acidentes graves. Muita gente elogiou o comportamento da
TAM naquele episódio. Eu mesmo acho que eles foram ótimos. Conseguiram reduzir
ao mínimo as conseqüências inevitáveis do acidente.
Mas não
foi, como muita gente quis dizer, puro feeling. Pura intuição de marketing do
Comandante Rolim (até porque ele não estava no Brasil no momento do acidente e
só voltou no dia seguinte).
Foi, antes
de tudo, uma manifestação de competência, de preparo e de planejamento. A
empresa agiu rápida e eficientemente porque estava “esperando” que coisas desse
tipo acontecessem. Os procedimentos já estavam previstos.
E, justiça
seja feita, se o acidente tivesse ocorrido com qualquer uma das outras grandes
companhias de aviação, o comportamento, provavelmente seria o mesmo. Isto está
nos manuais de condução de crises que todas as grandes empresas têm.
Esta é a
lição que nós devemos tirar daquele lamentável acidente. Se você é prestador de
serviços, você precisa ter consciência de que alguma coisa pode um dia sair
errado. E você precisa pensar nessas coisas bem antes que elas aconteçam. Com a
cabeça fria para fazer o melhor planejamento possível.
Qual é o
arquiteto que deseja descobrir, com a obra em andamento e a concretagem
programada para o dia seguinte, que uma determinada escada, por erro do
projeto, não permite a passagem, em pé, de uma pessoa com mais de 1,70m.
Qual é o
engenheiro civil que gostaria de ver uma obra construída por ele, cair três
meses depois de concluída.
Qual
engenheiro eletricista quer ver uma indústria com todas as suas máquinas
paradas por uma semana, porque houve um erro no cálculo do dispositivo de
proteção e os transformadores queimaram.
Durante a
carreira profissional de um engenheiro ou de um arquiteto, problemas podem ocorrer.
Erros podem ser cometidos. Alguns menores, com pequenas conseqüências. Outros,
maiores, potencialmente destruidores de uma carreira. É óbvio que esses
problemas não são desejados.
Mas eles precisam ser previstos. Na hora de um
problema você precisa ter claro algumas considerações sobre marketing e precisa
saber com certa precisão o que fazer ou que postura assumir.
Vamos
sugerir alguns comportamentos e procedimentos que poderão ser úteis para a
minimização de um problema. Lembre-se: esses procedimentos e comportamentos
precisam estar introjetados em você. Não se trata de “sofrer por antecipação”.
Trata-se de estar preparado para administrar as conseqüências de um erro
profissional. Trata-se, também, de fazer as coisas certas desde o início,
evitando assim que um eventual erro profissional se transforme num desastre.
1. Não saia
por aí dizendo que você não tem culpa de nada. Que você fez tudo certo. Que
você está coberto de razão. Mas também não saia assumindo a culpa pelo
problema, a menos que você tenha certeza absoluta de que o problema foi gerado
por um erro seu. Muitas vezes aquilo que parece óbvio não é tão óbvio assim.
Não custa nada esperar um pouquinho antes de manifestar alguma conclusão. No
entanto, desde o primeiro momento, você deve mostrar-se disposto a aceitar que
o erro foi seu, desde que isso seja demonstrado.
2. Não fuja
do campo de batalha. Apresente-se no local do problema. Muitas vezes a vítima
(o cliente) não quer a reparação financeira pelo estrago causado. Ele só quer
ter alguém em quem possa colocar a culpa. Ele quer que você veja a cara dele
diante daquele desastre. Nessas horas, deixar de atender o telefone ou sair da
cidade é a maneira mais simples de amplificar o tamanho do problema. Além
disso, as pessoas têm um natural constrangimento de dizer “verdades” quando
estão na presença do principal atingido. Assim, se você estiver no local, já
reduz bastante o falatório;
3. Não
tenha a ilusão de que vai eliminar todo o problema, utilizando técnicas de
marketing e de relacionamento. Muitas vezes você precisa, além de reconhecer o
erro, assumir as conseqüências financeiras que o problema traz. Nesses casos
convém, antes de fazer o contrato, fazer uma análise de riscos e incluir
cláusulas que tratem do assunto.
Em alguns
casos, faça seguro. O seguro contra danos materiais causados por erros
profissionais, além de aumentar a sua segurança, pode ser uma boa propaganda da
sua empresa.
¹ Fonte: Ênio Padilha
Engenheiro,
escritor e palestrante. Formado pela UFSC, em 1986, especializou-se em Marketing Empresarial na UFPR,
em 1996/97.Escreve regularmente e seus artigos são publicados, todas as semanas, em
diversos jornais do país.
eniopadilha@uol.com.br
Postado por Davide Gouveia às quinta-feira, setembro 11, 2014
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