Artigo redigido por António Machado Vaz*
AMV13|2013-14
Recentemente
conheci Frederico Magalhães, um empresário Português que é um exemplo de
coragem e resiliência. Depois de subir ao nível mais alto a que um empresário
pode ambicionar, Frederico perdeu tudo – mas voltou a reconstruir a sua vida.
O texto que se
segue resulta de uma conversa que tivemos e de um artigo que foi publicado
sobre ele na revista EXAME. Uma história que, sem dúvida nenhuma, merece ser
contada.
Frederico nasceu e
cresceu em Moçambique, país de onde saiu em 1974, quando começou a guerra
civil. “Morreu imensa gente. Pensei na
sorte, no privilégio que era poder ir embora dali, apenas porque o meu pai
tinha acesso a uma avioneta” – lembra Frederico Magalhães. Por isso,
durante toda a sua vida, uma ideia nunca lhe saiu da cabeça: “Prometi a mim e a Deus que haveria de voltar
para ajudar a minha terra e os meus amigos”, afirma com nostalgia na voz.
Pouco tempo depois
de regressar a Portugal, voou para o Reino Unido, onde terminou a licenciatura
em Engenharia Mecânica, em 1980. Seguidamente, concluiu o doutoramento em
Automação na Universidade de Cranfield, onde, em meados dos anos 80, acumulava
as funções de professor e de investigador, dirigindo o departamento de
robótica, onde trabalhava com empresas como a Rolls-Royce ou a Jaguar. “Percebi que, se queria ganhar dinheiro,
tinha de montar uma empresa. Em 1988 associei-me a dois alunos, um alemão e um
inglês” e fundaram a Integral Vision, empresa que, em 1993, empregava já 50
pessoas - mais de metade das quais com mestrados ou doutoramentos. “Tínhamos de tomar uma decisão porque o
mercado estava a amadurecer. Ou nos deslocávamos para os Estados Unidos e
continuávamos a crescer, ou eramos comprados.” A oferta feita pela Medar
Inc. era irrecusável e a Integral Vision foi alienada por 10 milhões de euros.
“Eu detinha 25% do capital da empresa.
Vendemos a Integral Vision e ficámos com 10% da Medar”. Durante dois anos
viajou entre Portugal, os EUA e o Reino Unido para fazer a transferência de
conhecimento entre as duas sociedades.
Em 1996 esteve
prestes a ocupar o cargo de Chief
Operations Officer da Medar Inc. “Fui
com a minha mulher ao Michigan para procurar casa, escolher as escolas, comprar
carro… mas pedi um mês de férias para visitar Moçambique”. Quando chegou a
Chimoio, na Beira, a terra onde cresceu, não pôde fugir da sua promessa. “Estava à venda a Textáfrica, a empresa que o
meu pai tinha fundado em 1944 enquanto trabalhava para o Banco Português do
Atlântico”.
Em nome de um sonho
abdicou de um futuro no país mais rico do mundo e investiu, juntamente com o
pai, Manuel Magalhães, numa das regiões mais pobres do planeta. Ficou
responsável por uma fábrica com 60 mil metros quadrados, 2 mil hectares de
terreno, 2500 trabalhadores, ima aldeia, escolas, clinica…
“Nunca pensei que iria perder dinheiro. Tinha
um projecto, a preocupação era pôr toda a maquinaria a funcionar. E passados
dois meses estávamos a exportar tecidos para a Suiça”, afirma. “Em Moçambique as coisas correram mal por
todas as razões menos as lógicas”: Legislação fundamental para abrir o
mercado interno ao consumo foi publicada mas nunca aplicada. “Queria renovar a maquinaria e tinha um
financiamento do BEI de 18 milhões de euros. Passaram-se 1998, 1999, 2000 e a
lei nunca entrou em vigor. Não fiz aquele investimento e a fábrica fechou em
2000. Se o Governo Moçambicano tivesse dito logo no inicio que não conseguia
proteger o mercado interno, tínhamos aplicado outra estratégia.”
Mas uma desgraça
nunca vem só. À medida que a situação se degradava, a mulher de Frederico
ia-lhe pedindo que desistisse, que pensasse na família, que fossem embora dali.
Frederico ia-lhe pedindo que aguentasse. Só mais um esforço. Não podia desistir
enquanto ainda houvesse uma réstia de esperança de recuperar a fábrica. No
final de 1999, a mulher de Frederico tem um desastre de carro. Frederico fica
viúvo e passa a ser o único responsável pelos 4 filhos. “Desatinei durante um ano e meio. Só recomecei a trabalhar em Abril de
2001.” Reactivou a Sisqual, uma empresa em Matosinhos que fundara em 1992,
pouco antes de vender a firma britânica, e que se dedica ao desenvolvimento de
equipamentos e programas informáticos para recolha, backup e transferência de dados, utilizando suportes fixos e
móveis. Em 2004 facturou 1,3 milhões de euros – um crescimento de 50% face ao
ano anterior – sendo, actualmente, uma empresa com uma posição sólida em
Portugal e com escritórios em Angola, Cabo Verde, Moçambique e Brasil.
Frederico diz que
não desistiu “porque não podia desistir.
Tinha uma família que dependia de mim”. Diz também que, durante os períodos
de maior desespero, houve dois aspectos que lhe permitiram manter a sanidade: “o desporto – que me permitia distrair-me e
descansar a cabeça - e a minha fé em Deus. Apesar de tudo, acho que sou um
privilegiado. A convivência que tive com os meus amigos africanos, a forma como
eles encaram a vida, permitiu-me pôr as coisas em perspectiva”.
Sem dúvida uma
história inspiradora, que nos mostra que a vida não é feita só de conquistas;
que as tragédias acontecem – muitas vezes por fatores que estão fora do nosso
controlo; mas que é sempre possível “dar a volta” a uma situação desesperante.
* Colaborador nas publicações do Blogue desde Outubro de 2013.