quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Talentos Pivô: Caso Disneyland

A gestão do talento passa pela optimização da GRH com base na segmentação. Uma das segmentações mais importantes distingue recursos importantes e funções pivô. Recursos importantes são os que têm valor para organização. Funções pivô são aquelas nas quais pequenas mudanças produzem grandes diferenças para a estratégia e valor da organização. Esta distinção está bem patente através da gestão dos parques da Disneyland. Verifica-se que funções importantes (figuras da Disney como o Mickey, a Bela Adormecida ou a Fada Sininho) não correspondem às funções-pivô (varredores e empregados das lojas do parque).

De forma a se compreender o papel estratégico das pessoas aos diversos níveis da organização é interessante considerar o caso Disneyland. O posicionamento estratégico da organização consagra os seguintes aspectos:
  • Diferenciador chave: figuras da Disney.
  • Proposta de valor: "o lugar mais feliz da Terra".
  • Essência da marca: fantasia.   

Os pontos-pivô do processo são:
  • Entidades geradoras das maiores diferenças no objectivo estratégico da Disney de deliciar os clientes.

Os talentos importantes incluem:
  • Rato Mickey: figura muito trabalhada, normalizada e com elevados padrões.
  • A pessoa com o fato do Rato Mickey não é suposto interagir calorosamente com os clientes, pois qualquer erro poderia ser estrategicamente devastador.  
  • A pessoa com o fato do Rato Mickey nunca é vista, nunca fala e está sempre acompanhada pelo supervisor que gere os encontros com os convidados e assegura que o Mickey nunca cai ou se perde.
  • Qualquer investimento adicional na pessoa do Rato Mickey não tem repercussão significativa no objectivo estratégico de "deliciar os clientes".

Talentos-pivô:
  • Quando os "convidados" escrevem cartas a partilhar as experiências agradáveis nos parques da Disney, começam frequentemente por descrever encontros inesperados com outro pessoal da Disney que não as figuras da Disney.
  • Quando os convidados  têm um problema tendem a dirigir-se aos varredores e empregados das lojas, muitos mais acessíveis do que as figuras Disney.
  • Os varredores constituem, hoje, talentos pivô da Disney.
  • A empresa investe fortemente na sua formação e remunera-os acima da concorrência, o que lhe permite seleccionar os melhores varredores do ponto de vista da qualidade da relação com os clientes.
  • Os varredores participam nas equipas de design de novos parques e na reestruturação dos existentes, e são considerados pela gestão como representantes dos clientes com vassouras na mão. 
  • O investimento nos varredores tem repercussão significativa no objectivo estratégico de "deliciar os clientes".    

Outros exemplos de funções-pivô nas organizações são os compradores nas empresas de retalho ou os técnicos com competências para gerarem bons ambientes de trabalho em equipa. O conceito de valor marginal/pivô contribui para mudanças das estratégias de RH e pode conduzir igualmente a alterações da estratégia do negócio. Ilustra ainda o facto de o talento estar disperso na organização, não sendo apanágio exclusivo de um grupo de "estrelas". As organizações que se focalizam apenas nas figuras importantes mas descuram os pivôs podem ver o seu desempenho negativamente afectado. O caso da Disney apresentado ajuda a compreender como actividades desprestigiadas e aparentemente pouco relevantes para as organizações podem exercer um efeito significativo na relação com os clientes - e o leitor pode facilmente compreender como esse papel poder ser especialmente saliente em organizações de serviços.

Fonte: Gomes et al. (2008, p. 123-124).

Sugestão para aprofundamento:
Boudreau, J. W. & Ramstad, P. M. (2007). Beyond HR. Boston, MA: Harvard Business School Press.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Flexigurança - A cura ou a doença?

Flexigurança é um novo termo em debate acerca do futuro do mercado de trabalho na Europa e o desenvolvimento de políticas sociais. Refere-se à conciliação de elevados níveis de segurança. Ou seja, a flexigurança significa não ter de escolher entre flexibilidade e segurança, mas antes conciliar formas flexíveis de trabalho com garantias de protecção social tais como o acesso a formação profissional. Por exemplo, se os trabalhadores renunciam a um aumento salarial durante um determinado período, são compensados com flexibilidade interna: formação contínua, que lhes garante um lugar futuro no mercado de trabalho; redução no número de horas de trabalho, que favorece a gestão de tempo e a conciliação trabalho-família; etc. Ou seja, os trabalhadores recebem mais protecção social e segurança em troca de medidas de flexibilidade que também beneficiam a empresa.
A flexigurança pretende combinar uma adequada protecção ao trabalhador e flexibilidade suficiente no mercado de trabalho que permita às empresas tomar as medidas necessárias de reestruturação para se manterem competitivas em que o processo de recrutamento e o despedimento de trabalhadores sejam facilitados, isto é, o objectivo é a protecção das pessoas e não a protecção do posto de trabalho. O posto de trabalho está sujeito às mutações industriais, aos avanços tecnológicos e à exigência de qualificação e competência profissional dos trabalhadores.
Se quisermos simplificar podemos dizer que a flexigurança é uma combinação de despedimentos flexíveis com subsídios de desemprego generosos. O modelo tem sido aplicado na Dinamarca e na Holanda e está a ser debatido na União Europeia, tendo já dado origem ao livro verde. Porém, existem fundadas dúvidas de que a aplicação desse modelo em Portugal possa ter o mesmo sucesso que tem tido naqueles países do Norte da Europa. A introdução, como contrapartida pela flexibilização do mercado de trabalho, de subsídios de desemprego mais generosos pode ter um efeito perverso. É que os portugueses não têm a mesma consciência e preocupação cívica que têm os dinamarqueses ou dos holandeses. É pois, muito provável que a concessão de elevados subsídios de desemprego viesse a contribuir para a criação de novos subsídio-dependentes que se limitariam a usufruir dos generosos subsídios de desemprego, fugindo, "como o diabo foge da cruz", da oferta de um novo emprego.
Desafio ao leitor:
  • Discuta este ponto de vista de Isabel Meireles: "A questão (...) que se coloca é se é possível fazer um transplante de um modelo de flexigurança de um dador que é incompatível com o paciente, que se arrisca, assim, a morrer. Sabemos todos que a mentalidade e a predisposição laborais de um português não são exactamente iguais à de um dinamarquês, nem sequer aproximadas, nomeadamente em características como o rigor, organização, pontualidade, transparência e tantas outras que para os orgulhosos vikings são genéticas e que para os lusitanos vão levar gerações a adquirir. Em qualquer caso, é certo que há que abanar o sistema instalado, mais que não seja jus ao aforismo popular de que se não morrer da doença, morre da cura".
Fonte: Gomes et al. (2008, p. 86-87).

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Competências Requeridas ao Profissional de RH

A introdução do conceito de competência surgiu acerca de 3 (três) décadas através do psicólogo David McClelland num artigo que foi publicado na revista American Psychologist, e intitulava-se Testing for competence rather than intelligence. McClelland sugeria que os tradicionais testes de inteligência e de aptidão académica não seriam suficientes para prever o sucesso no trabalho, sendo necessário criar um perfil das competências necessárias ao eficaz desempenho duma função (Gomes et al., 2008). Segundo Parry (1998) a competência define-se como “um conjunto de conhecimentos, atitudes e capacidades relacionadas, que afecta a maior parte de uma função (i.e., um ou mais papéis ou responsabilidade chave), que se correlaciona com o desempenho na função, que se pode medir relativamente a padrões aceites, e que se pode melhorar por via da formação e desenvolvimento” (as cited in Gomes et al., 2008, p.541).


O cenário organizacional mudou de forma sensível ao longo dos anos, tornando-se cada vez mais complexo e imprevisível, exigindo competências fundamentais ao profissional de RH, para que este tenha uma actuação estratégica e contribua eficazmente para o desempenho organizacional. Vários pesquisadores, que estudam o papel da área da gestão de RH, discutem as competências requeridas a um profissional para a execução plena das suas funções. Começo por referir o estudo de Richard Boyatzis (cit. in Gomes et al., 2008, p. 543) que identificou um 5 (cinco) grupos de competências superiores de gestão, que serviu de ponto de partida para outros estudos desenvolvidos por investigadores e consultores. Os grupos de competências identificados no estudo são:


Gestão da acção e dos objectivos – capacidade de fazer que as coisas aconteçam, relativamente a um objectivo, ou de forma consistente com um plano.


• Preocupação com o impacto: Preocupação com status e reputação.

• Uso de conceitos para diagnóstico: identificação e reconhecimento de padrões com base em informação diversa, e sua utilização para interpretação dos acontecimentos.

• Orientação para a eficiência: Preocupação em fazer melhor.

• Proactividade: Disposição para agir a fim de alcançar resultados.


Liderança – Capacidade de activar as pessoas através da comunicação de objectivos e planos, estimulando o interesse e o envolvimento.


• Conceptualização: Desenvolver um conceito que descreve um padrão ou uma estrutura num conjunto de factos.

• Autoconfiança: Saber o que se está a fazer e sentir que se está a fazer bem.

• Uso de apresentações orais: Fazer apresentações verbais eficazes, quer em situações de uma para um, que nas que envolvem muitas pessoas.


Gestão de Recursos Humanos – Capacidade para gerir a coordenação de grupos de pessoas que trabalham juntas em prol dos objectivos da organização.


• Uso do Poder socializado: Usar formas de influência para criar alianças, redes, coligações e equipas.

• Gestão do processo do Grupo: Estimular outros a trabalharem eficazmente em situação de grupo.


Atenção ao Outro – Maturidade e posse de uma visão equilibrada de acontecimentos e pessoas.


• Objectividade perceptual: Ser relativamente objectivo, evitando o preconceito.

• Autocontrolo: Ser capaz de inibir necessidades ou desejos pessoais em prol das necessidades organizacionais.

• Energia e adaptabilidade: Ser capaz de trabalhar muitas horas e de ter a flexibilidade para se adaptar às mudanças na vida e na envolvente organizacional.


Direcção de subordinados – Capacidade de transmitir feedback de forma construtiva.


• Direcção de subordinados: Competências para desenvolver os outros.


É importante referir que estas competências apresentadas pelo autor não são neutrais, possuem uma conotação valorativa, pois presume-se que estão associadas a níveis de desempenho superior (correspondentes aos 10% do topo). Diferenciam-se das competências liminares, que corresponde ao nível de trabalho minimamente aceitável.


É importante apresentar agora as competências identificadas por Becker, Huselid e Ulrich (2001) que se focalizaram exclusivamente nas competências requeridas a um profissional de RH. Sendo assim, para Becker et al. (2001), existem cinco competências fundamentais que um profissional de RH deve possuir para a obtenção de alto desempenho das suas funções:


Conhecimento do negócio – O profissional de RH agrega valor à organização quando compreende o funcionamento do negócio. Um bom entendimento do negócio vai permitir ao profissional de RH antever oportunidades e ameaças e antecipar-se no sentido de implementar projectos e inovação.


Domínio de práticas de GRH – Uma premissa para que o profissional de RH alcance o alto desempenho é invariavelmente o domínio das ferramentas de trabalho e melhores práticas aplicáveis à GRH. Cabe ao profissional de RH investir na sua especialização, já que isso trará benefícios ao nível da credibilidade, resultados e satisfação dos clientes internos.


Gestão de cultura – A gestão da cultura requer o conhecimento dos valores que orientam a conduta e os comportamentos das pessoas. Os sistemas e arquitectura de RH devem reforçar valores coerentes com a cultura que a empresa desejar instaurar na busca por coerência com a estratégia. O profissional de RH deve estar capacitado para oferecer apoio consultivo aos gestores organizacionais, auxiliando-os a harmonizar os seus projectos e a cultura da organização.


Credibilidade pessoal – Enquanto as demais competências podem ser consideradas como pilares da actuação do profissional de RH, a credibilidade pessoal pode ser vista como a base de fundação sobre os qual se apoiam os pilares. Somente através da credibilidade o profissional de RH será capaz de persuadir a gestão de topo e os gestores de linha em relação à estratégia de GRH.


Gestão da Mudança - Esta é mais um exemplo de como o profissional de RH se pode consolidar como parceiro estratégico. O profissional de RH dever ser capaz de orquestrar os processos de mudança através de habilidades como, diagnóstico de problemas, relacionamento com clientes internos, gestão de projectos e solução de problemas.