quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Avaliação de desempenho PORQUÊ? [1]

Artigo redigido por António Machado Vaz*  
AMV7|2013-14 

O Governo anunciou que a avaliação de desempenho passará a ser o principal critério de selecção na extinção de postos de trabalho. As reacções não se fizeram esperar: a UGT e a CGTP vieram dizer que “não é possível conceber” que o factor determinante seja a avaliação de desempenho, quando “95% das empresas portuguesas” não têm avaliação de desempenho objectiva. E, de facto, na grande maioria das empresas portuguesas não está instituído qualquer sistema meritocrático. Nem sequer se sabe qual o real contributo de cada trabalhador para a organização. Todo o sistema está montado para premiar, sobretudo, a antiguidade (exemplo disso são as diuturnidades e as promoções automáticas). Acontece que um sistema de compensação baseado na antiguidade convida ao conformismo e à apatia: para quê trabalhar mais do que o estritamente necessário se sei que daqui a 5 anos serei promovido, independentemente do esforço que faça?

O problema é que estamos inseridos num mercado global e altamente concorrencial. As empresas precisam de criar vantagens competitivas – e isso só se faz (1) ou gerando inovação com valor de mercado, (2) ou fazendo mais “bonito” (3) ou fazendo mais barato que a concorrência.

Ora, para criar vantagens competitivas, mais do que trabalhar MUITO, interessa sobretudo é trabalhar BEM. Com qualidade. Porque, se for para trabalhar muitas horas mas de uma forma acrítica – sem pensar no que se está a fazer, para quê e como pode ser melhorado – há quem faça o mesmo mas mais barato: há 3 MIL MILHÕES de chineses e indianos que ganham menos de € 100 dólares por mês; que trabalham 7 dias por semana e que não tiram férias. Mas não é desses trabalhadores que o país precisa. O que é necessário é gente que trabalhe com qualidade – gente que acrescente valor. É aqui que entra a avaliação de desempenho:

Mas a avaliação de desempenho tem de ser vista como apenas uma etapa de algo maior: porque se a empresa precisa de saber o que é que cada um contribui para os objectivos da organização, antes disso, é preciso saber o que é esperado de cada pessoa (quais são as suas responsabilidades individuais). Além disso, é preciso que toda a gente saiba para onde é que “barco” vai: onde é que queremos que a empresa esteja daqui a um ano – ou daqui a 10 - e o que é que eu, individualmente, e a minha equipa, podemos fazer pra ajudar. Depois disso, é preciso, todos os anos, agir sobre o resultado: apostando nos melhores, premiando as boas performances e corrigindo as menos boas. Só assim é que se melhora.

Como é que isto se faz?

O primeiro passo (antes da avaliação de desempenho) é, como disse, definir objectivos concretos – e para isso é preciso ter um MANUAL DE FUNÇÕES que estabeleça claramente as responsabilidades de cada função.

1ª vantagem: acaba-se “o jogo do empurra” tão típico das organizações (“ai isto não é a mim que me compete!”).

2ª vantagem: permite às chefias fazer uma avaliação realista e consistente do desempenho dos seus colaboradores, face aos objetivos da empresa.

3ª vantagem: ajuda a alocar as pessoas com as características certas para os lugares certos.

Aí sim, a empresa está em condições para fazer uma verdadeira AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO. Mas porque é que isso é importante? Porque desconfiamos das pessoas?!

Nada disso! O que é necessário saber é se cada trabalhador em concreto (1) está sobrecarregado, (2) se perde muito tempo com trabalho sem grande valor acrescentado, (3) se faz bem ou mal aquilo que é suposto - e porquê. Para isso, é preciso medir o desempenho de forma objectiva (ie, com números), para ir melhorando gradualmente (para saber onde temos de melhorar) – e isso faz-se desenvolvendo indicadores de desempenho para cada função (os célebres KPIs).

A ideia é apurar o nível de realizações da organização – e isso faz-se (1) medindo as performances e depois (2) comparando os resultados com as metas pré-estabelecidas. É dessa forma que depois temos a noção dos desvios e de onde podemos melhorar. Como dizia Peter Drucker, “You cannot manage what you do not mesure” (só se consegue gerir o que se consegue medir). A questão é que nós já sabemos isso. O que é a contabilidade se não medir a realidade em números, para depois podermos basear as nossas decisões financeiras nessa informação? Porque é que, então, não havemos de fazer a mesma coisa em relação aos Recursos Humanos? Porque é que as empresas não hão de ter alguém que ajude as chefias a desenvolverem indicadores de desempenho para as suas equipas? Que as ajude a trabalhar esses números para os discutir – de uma forma construtiva – com cada trabalhador? É isto que permite (1) estabelecer compromissos e (2) definir conjuntamente as metas a atingir e (3) de que forma é possível fazê-lo.

Por fim, temos que ver o que é que podemos fazer com os resultados da avaliação de desempenho – o tal “agir sobre o resultado”. Se os resultados são maus (e se sabemos porquê – graças à avaliação de desempenho) então há que melhora-los. Como? Despedindo as pessoas? Não. É de todo o interesse para a empresa apurar se os resultados não surgem por deficiência da organização face ao mercado ou se por falta de qualificações do trabalhador. Como tal o trabalhador só deverá ser despedido ao fim de 2 ou 3 avaliações negativas consecutivas. Durante esse período, a empresa terá de assumir a responsabilidade de lhe dar formação específica ou muda-lo para um posto de trabalho mais consentâneo com as suas características (o envolvimento do trabalhador na solução é fundamental). Isto se os resultados forem maus. Mas e se forem bons?

Não podemos tratar os nossos trabalhadores como nossos partners, querer envolve-los nos destinos da empresa …e depois, quando “chegamos à meta”, não mostrar apreço pelo esforço que eles fizeram. Por isso mesmo, se é pedido um esforço adicional às pessoas (e se esse esforço dá frutos), devo, então, recompensa-lo. A ideia é sobretudo mostrar apreço por um trabalho bem feito – e há várias formas de o fazer. Por exemplo: premiar os que atingem 100% dos objectivos definidos no início do ano, com um aumento salarial igual à taxa de inflacção. Se chegar aos 120% (ou seja, se exceder claramente o que lhe foi proposto) irá ter um aumento acima da inflacção. Recorrentemente temos ouvido que não “não estamos em tempo de pagar prémios”. Mas, como dizia Kim Nordston, “se pensa que a competência é cara, nem imagina o custo da incompetência”. E acreditem: se os objectivos tiverem sido bem definidos, esses ganhos de produtividade têm que mais que compensar o acréscimo de custos salariais. Empresas como a Apple – considerada um exemplo de inovação e sucesso competitivo – sabem a importância de alinhar os interesses da organização com o dos seus trabalhadores e de lhes mostrar que o seu sucesso está intimamente ligado ao sucesso da organização. Para ilustrar a importância dos incentivos, Steve Jobs - que tinha um salário simbólico de 1 dólar por ano - dizia: “Eu ganho 50 cêntimos só por pôr cá os pés. Os outros 50 cêntimos dependem do meu desempenho”.

Conclusão: Não adianta criticar todas as soluções propostas. Ao consagrar a avaliação de desempenho como critério principal na extinção de postos de trabalho, o governo está precisamente a incentivar a implementação de um sistema que privilegia a meritocracia e que – como dizem as centrais sindicais – é alheio a “95% das empresas portuguesas”

Mas não tenhamos ilusões: só olhando para este sistema como um todo é que podemos retirar daí as vantagens que estas valências, quando encaradas de forma isolada, não nos dão. Resumidamente, o todo é maior do que a soma das partes. Só investindo em todo o processo (e não apenas num ou outro elemento) é que conseguimos obter resultados.

Trata-se, como disse, de uma aposta: Uma aposta na melhoria contínua. Uma aposta na capacidade das pessoas como elemento DIFERENCIADOR da empresa. Ainda recentemente, o Bagão Félix dizia: “numa empresa, o dinheiro é o lubrificante – é aquilo que não deixa o motor gripar. Mas a gasolina – o que poe a maquina em movimento - são AS PESSOAS.” É ISSO que diferencia as empresas. Agora vamos imaginar que não fazemos nada disto…  Daqui a 20 anos como é que estaremos? Pensem, por exemplo, há 20 anos atrás, quantos empresários não terão dito: “eu não preciso de computadores para nada! O trabalho faz-se na mesma com papel e lápis. Há 50 anos que trabalho assim e não vejo porque hei-de mudar.” É que as circunstâncias alteraram-se MUITO DEPRESSA – e como dizia Einstein, "Loucura é continuar a fazer as coisas como sempre fizemos  ...e esperar resultados diferentes.

[1] Artigo publicado in Revista Vida Económica (sexta-feira 7 de Fevereiro de 2014). 
* Colaborador nas publicações do Blogue desde Outubro de 2013.