Artigo
redigido por António Machado Vaz*
AMV4|2013-14
1 – O estudo
Um estudo académico elaborado
durante 10 anos por investigadores de Standford e da London School of
Economics, dedicou-se a medir as diferenças
de produtividade entre vários países.
A importância deste estudo – publicado em 2010 – é a sua abrangência e o facto de
se basear em dados objectivos, avaliando as práticas de gestão de cerca de 6
mil empresas de 17 países.
A ideia era saber porque
é que num mercado global, há empresas tão mais produtivas “por trabalhador” do
que outras. É que, mesmo expurgado das vantagens competitivas que cada empresa
terá em relação às outras (ex: patentes tecnológicas), a diferença de
produtividade entre empresas, é substancial: por exemplo, no mercado americano,
o top 10% das empresas mais produtivas, produz 4 vezes mais por trabalhador do que as 10% menos produtivas.
E nos países? Será que
há factores culturais ou inatos das populações que explique os défices de
produtividade de um país em relação a outros? E o número de horas de trabalho?
Será um factor a ter em conta na produtividade?
A resposta é que o factor crucial é a qualidade da gestão: independentemente
da sua nacionalidade, as empresas com má gestão são em regra pouco produtivas,
enquanto que as que têm boas práticas são as mais competitivas.
Um factor que leva a
crer que a produtividade não depende de factores culturais ou inatos das
populações de cada país é o facto de as multinacionais,
independentemente do país onde têm representação, conseguirem sempre implementar
uma boa gestão e ter um índice de produtividade média elevado - mesmo em países
onde as práticas de gestão nas empresas à sua volta são muito más, as
multinacionais conseguem implementar uma boa gestão e ser muito mais produtivas
do que as empresas nacionais. Ou seja: não há nada de inato ou cultural que
torne os habitantes locais ineficientes. São, simplesmente, mal geridos.
O número de horas
trabalhadas também não é relevante: segundo dados da OCDE
no que toca a horas de trabalho, os alemães são “preguiçosos” e os gregos “trabalhadores”.
Em 2011, cada grego trabalhou em média 2017 horas, enquanto cada alemão
trabalhou apenas 1413. Essa situação é explicada pela famosa lei de Parkinson
que diz que o trabalho se expande até preencher o tempo disponível para a sua
realização – por outras palavras, qualquer que seja o tempo adicional que haja
para realizar uma tarefa, ela pode “estender-se” para ocupar o tempo
disponível. Ou seja: o que conta não é a quantidade, mas a qualidade do tempo trabalhado. E isso também se relaciona com a
forma como esse trabalho é gerido. Já agora, no mesmo período, cada português
trabalhou, em média, 1711 horas.
Mas, quais foram os
aspectos da gestão sobre os quais incidiu a avaliação do estudo? A gestão que
se fala é a gestão do dia-a-dia da empresa, i.e., na capacidade das empresas:
(1)
monitorizarem a informação – como é que controlam
o que se passa dentro da organização e utilizam essa informação para melhorar
procedimentos;
(2)
fixarem metas – se conseguem estabelecer
metas adequadas, ir seguindo os resultados e tomarem as medidas adequadas caso
esses resultados não sejam adequados às metas;
(3) darem
incentivos – como é que se promovem e recompensam os trabalhadores com base no
mérito e no desempenho e tentam contratar e manter os seus melhores
trabalhadores.
2 – O caso Português
Entre os países incluídos
no estudo conta-se Portugal (com 140 empresas) o que permitiu que, pela
primeira vez, fosse possível avaliar a
qualidade das nossas práticas de gestão comparativamente com outros países.
E talvez não surpreenda
muita gente que a qualidade da nossa gestão seja considerada globalmente má. A surpresa
está em saber o quão má ela é:
Ranking
por País
|
Total
(média das 3 rúbricas seguintes)
|
Monitorização
da informação
|
Fixação
de metas
|
Incentivos
e recompensas
|
N.º de
empresas na amostra
|
1º
|
EUA
|
3,33
|
3,44
|
3,23
|
3,30
|
695
|
2º
|
Alemanha
|
3,18
|
3,40
|
3,24
|
2,95
|
336
|
3º
|
Suécia
|
3,18
|
3,54
|
3,22
|
2,86
|
270
|
4º
|
Japão
|
3,15
|
3,20
|
3,25
|
2,90
|
188
|
5º
|
Canadá
|
3,13
|
3,35
|
3,02
|
3,02
|
344
|
6º
|
França
|
3,00
|
3,28
|
2,98
|
2,78
|
312
|
7º
|
Itália
|
2,99
|
2,98
|
2,80
|
2,73
|
194
|
8º
|
Austrália
|
2,99
|
3,27
|
2,96
|
2,76
|
382
|
9º
|
Grã-Bretanha
|
2,98
|
3,16
|
2,93
|
2,88
|
762
|
10º
|
Irlanda
do Norte
|
2,91
|
3,01
|
2,84
|
2,86
|
92
|
11º
|
Polónia
|
2,88
|
2,88
|
2,93
|
2,85
|
231
|
12º
|
Rep.
Irlanda
|
2,84
|
2,95
|
2,76
|
2,81
|
102
|
13º
|
Portugal
|
2,79
|
3,07
|
2,72
|
2,61
|
140
|
14º
|
Brasil
|
2,69
|
2,81
|
2,68
|
2,60
|
559
|
15º
|
India
|
2,65
|
2,62
|
2,66
|
2,67
|
620
|
16º
|
Grécia
|
2.65
|
2,90
|
2,56
|
2,50
|
171
|
17º
|
China
|
2,64
|
2,72
|
2,53
|
2,66
|
524
|
Os EUA têm, em média, os
melhores resultados ao nível das práticas de gestão, seguidos da Alemanha,
Japão, Suécia e Canadá. Seguem-se, depois, um grupo de países da europa central
– França, Itália, Irlanda, Reino Unido e Polónia.
As práticas de gestão
portuguesas estão no fundo da tabela, abaixo, por exemplo, das polacas. Aliás,
só estão acima das gregas e de países que, embora sejam autênticos colossos
económicos, ainda são considerados em vias de desenvolvimento - como o Brasil,
a India e a China – e que, como tal, carecem ainda de competências de gestão.
A esse respeito, diga-se
que os principais aspectos diferenciadores entre países no que toca à qualidade
da gestão - e, por inerência, ao nível de produtividade das suas empresas -
são, segundo este estudo, o capital
humano e a concorrência do mercado:
isto porque, quanto melhor preparadas academicamente forem, em média, as
pessoas da empresa, melhor irão identificar a importância das medidas de gestão
a implementar e melhor irão corresponder a essas medidas; e quanto mais
concorrencial for o mercado em que se movem as empresas (quanto menos
protecionista e regulado for esse mercado), maior será a exigência, pelo que
apenas as boas empresas, as mais competitivas é que conseguirão sobreviver
(aquelas que não têm outro remédio se não serem produtivas).
Olhando para as
categorias individuais do referido estudo, os portugueses dão-se pior precisamente
na gestão do capital humano.
Comparativamente com os restantes países analisados, as empresas portuguesas
descuram os incentivos no local de trabalho; não recompensam os melhores
funcionários; não castigam os piores; não são capazes de recuperar membros
improdutivos das suas equipas e elevar o seu desempenho – o que também passa
pela formação contínua que é ministrada.
Parte da explicação tem
a ver com a excessiva regulamentação do mercado laboral – nomeadamente, com a
extensão e rigidez da legislação laboral – situação que foi identificada pela Troika e que está a ser
objecto de correcção, de modo a ficar alinhada com os restantes regimes
europeus.
Mas, essa não é a única,
nem sequer a principal, explicação para o problema, pois, apesar de a
legislação gerar, de facto, alguma entropia (como será analisado adiante),
existe sobretudo uma desconfiança latente da parte dos empresários portugueses
relativamente á eficácia de uma política estruturada de recursos humanos. Para
a maioria das empresas portuguesas, recursos humanos é pouco mais do que o
processamento de salários.
Porque é que os sistemas de monitorização e de incentivos
são importantes para aumentar a produtividade?
A teoria económica
responde a isso através da teoria da
agência.
3 – A Teoria da agência
Uma
relação de agência ocorre quando o principal delega direitos num agente,
através de um contrato (formal ou informal), ficando assim o agente obrigado a
representar os interesses do principal em troca de uma remuneração de qualquer
espécie.
Acontece
que nem sempre os interesses do principal e do agente coincidem, sendo, por
vezes, até conflituantes. O que a teoria da agência diz é que os agentes tendem
a assumir comportamentos oportunistas, colocando os seus interesses próprios
acima dos interesses da entidade que é suposto representarem (o principal).
Não
se trata aqui de fazer juízos de valor relativamente a quem quer que seja.
Trata-se, isso sim, de agir de acordo com um dos princípios da teoria
económica: o de que os agentes económicos são tendencialmente egoístas e
racionais – ou seja, que cada um tende a fazer sempre o que é melhor para si em
primeiro lugar.
Por
exemplo, um vendedor que receba comissões de venda, tem tanto interesse em
vender o máximo possível como o seu empregador (principal). Mas se os seus
incentivos forem no sentido de vender a máxima quantidade possível do produto –
sem olhar á margem de lucro que reserva para a empresa –o vendedor ver-se-á
tentado a vender com o máximo desconto que lhe seja permitido, colocando assim
os seus interesses (de receber comissões) acima dos do principal que representa
(os de maximizar o lucro em cada venda).
Este
comportamento acontece tanto mais quanto mais assimetria de informação e custos
de monitorização existirem:
Quando
há informação perfeita e livre, é fácil ao principal monitorizar o desempenho
do agente e estabelecer um conjunto de sanções ou de incentivos – por exemplo:
numa relação de trabalho com um operário, é relativamente fácil ao empregador,
através das chefias intermédias, controlar quantas peças determinado operário
produziu naquele mês. Mas, nem sempre a corrente de informação é assim tão
clara: geralmente é o agente quem tem vantagem em relação ao principal, visto
que é ele que detém o conhecimento sobre a tecnologia para a produção de bens e
serviços; por exemplo: um
administrador de uma empresa não terá conhecimento de engenharia que lhe
permitam aferir se determinado processo desempenhado por um engenheiro ao seu
serviço é mais ou menos complicado e se justifica mais ou menos a demora na sua
execução. Nestes termos, na ausência de informação, será difícil ao principal
controlar o desempenho do agente. O agente está, assim, numa posição de
vantagem, na medida em que tem mais informação do que o principal.
O
contrato de trabalho serve para tentar mitigar o comportamento oportunista dos
agentes, mas, quanto mais difícil for medir o “output” do agente (as tarefas
que ele irá desempenhar), mais difícil será a elaboração desse contrato. Mesmo
que, por absurdo, se tentasse prever exaustivamente todo o manancial de tarefas
que o trabalhador poderia ou não desempenhar, ainda assim, sempre que esteja
associada a determinada função alguma independência técnica, será sempre
forçoso manter uma esfera de liberdade no desempenho das tarefas associadas a
essa função – liberdade essa que pode ser utilizada pelo trabalhador ao serviço
dos seus interesses, dos da organização ou de ambos.
Este
problema será ainda mais premente no caso das tarefas não-programadas –como é o
caso das tarefas de gestão. Nesses casos, os agentes podem não exercer grande
esforço durante períodos prolongados sem que isso tenha reflexo nos resultados,
visto que estes levam o seu tempo a emergir, ficando sempre na dúvida se os
resultados não surgiram por falta de esforço do agente ou por circunstâncias
exógenas – como por exemplo, circunstâncias de mercado adversas. Esta tomada de
consciência por parte do agente de que pode limitar-se a fazer o mínimo
possível sem que daí advenham grandes consequências designa-se como risco moral
(ou moral hazard) e também pode
surgir, inconscientemente, pela desmotivação, por uma certa acomodação
decorrente da falta de incentivos de curto-prazo.
Daí
a importância dos sistemas de controlo
de gestão: para prover pelo alinhamento
dos interesses do principal com os do agente.
Assim
sendo, é necessário que as empresas tenham metas
previamente definidas, tenham mecanismos que lhes permitam monitorizar/acompanhar os progressos de
cada trabalhador na prossecução dessas metas, avaliar a performance e recompensarem-nos
de acordo com a realização desses objectivos – ao fim e ao cabo, os
elementos de gestão que foram avaliados pelo estudo de Bloom e Van Reenen e em
que assentam os níveis de produtividade das empresas.
Mesmo
os casos de risco moral podem ser travados com sistemas de controlo de gestão
que tomem em consideração certas variáveis-chave e value drivers – como é o caso do tableaux de bord e do balanced
scorecard desde que a relação causa-efeito entre as variáveis instrumentais
e as variáveis resultado esteja bem desenhada.
4 – O sistema de recompensas
Na
grande maioria das empresas portuguesas subsiste, ainda, o sistema de
recompensas clássico, que premeia, sobretudo, a lealdade e a antiguidade – isto,
muito por influência da matriz da contratação colectiva, marcadamente
ideológica, que ainda hoje regula a generalidade das actividades do nosso país
e que rejeita explicitamente o princípio da remuneração em função do
desempenho, interpretando de forma literal e restritiva o princípio
constitucional de que «para trabalho igual, salário igual» (art. 60º n.º 1 al.
a) da CRP)
Desta
estrutura de recompensas são exemplo típico os prémios de antiguidade, as
diuturnidades e as promoções automáticas.
Acontece
que um sistema de recompensas baseado na antiguidade convida ao conformismo e à
apatia, potenciando os pressupostos em que assenta a teoria da agência. Isto,
num contexto de mercado global e altamente concorrencial, em que as empresas
precisam de quadros com autonomia e criatividade, que corram riscos e
contribuam decididamente para os resultados do negócio.
Para
conseguir atrair e reter pessoas com esse perfil é necessário apostar num sistema de incentivos que alinhe as
recompensas com os objectivos estratégicos, a curto e médio prazo,
estabelecidos pela empresa e o valor acrescentado que cada trabalhador traz
para a sua concretização. E para que esse sistema funcione adequadamente tem de
basear-se num sistema de gestão por
objectivos (a tal “fixação de metas”),
que permita a cada trabalhador saber antecipadamente o que é esperado dele, e
num sistema de avaliação de desempenho
(a “monitorização da informação”),
que lhe permita saber como vai ser medida a sua performance individual e,
portanto, a sua contribuição para alcançar os resultados globais da empresa.
Uma
preocupação comum em relação aos sistemas de incentivo é que estes tenham, como
consequência inevitável, o aumento dos custos salariais globais da empresa.
Na
verdade, como decorre do estudo em análise, a ideia ao usar estas práticas é
precisamente aumentarem a produtividade por trabalhador (que, nos casos de
maior sucesso, chega a ser quatro vezes mais), permitindo que as empresas
funcionem com menos trabalhadores,
mais qualificados e com mais competências. Como tal, daí não decorrerá
necessariamente que a massa salarial da empresa seja mais pesada: trabalhadores
mais qualificados e bem pagos, são trabalhadores sintonizados com os interesses
do principal e, portanto, mais produtivos. E com uma maior produtividade
individual, uma empresa conseguirá resultados idênticos – se não superiores –
aos que conseguiria com mais pessoas, menos qualificadas e mais mal pagas.
Daí
que a produtividade incremental, que permite desenvolver a actividade
empresarial com um quadro de pessoal bastante mais reduzido, mais do que
compensa os custos adicionais em salários.
Por
outro lado, as empresas que consideram os baixos custos salariais como uma
vantagem competitiva, tendem a perder em qualidade de produto e a ver os seus
melhores quadros gravitarem para os mercados que remunerem melhor as suas
capacidades – que é, infelizmente, o que se passa actualmente no nosso país,
com a fuga de quadros para o estrangeiro.
5 – Os planos de
carreira:
O
alinhamento dos interesses entre o principal e o agente não se faz só, a
curto/médio prazo, através de recompensas, mas também pela perspectiva de
progressão na carreira dentro da organização. Nesse aspecto, a avaliação de
desempenho servirá também para conhecer e medir as potencialidades dos
trabalhadores, podendo, depois, esse potencial ser fomentado pela organização,
tendo em vista o desenvolvimento profissional do trabalhador.
Uma
das obrigações legais que decorrem do Código do Trabalho (já desde a revisão
anterior) é a formação contínua dos quadros da empresa, tendo cada trabalhador
direito a 35 horas de formação anual. Numa organização bem estruturada, esse
será, inclusivamente, uma necessidade da própria organização, dada a tendência
para o “achatamento” da estrutura hierárquica: de facto, com a eliminação de
estruturas intermédias de gestão, criaram-se funções de conteúdo muito mais
rico e variado e com uma autonomia alargada, que exigem perfis de competência
mais exigentes.
O
problema é que, se por um lado esse “achatamento” cria funções mais exigentes e
desafiantes, por outro, a redução dos níveis hierárquicos também limita as
hipóteses de promoção vertical, como acontecia antigamente.
O
que hoje procura preencher esse «vazio» é o modelo de progressão de carreira em
ziguezague, em que as movimentações laterais, para outras áreas funcionais
dentro da organização, vão adicionando novas competências às que o trabalhador
já detinha, proporcionando-lhe novos desafios e, simultaneamente, maior
flexibilidade e polivalência á força de trabalho.
6 - O tratamento legal
dado aos sistemas de incentivo:
Apesar
das reformas legislativas que, no campo laboral, têm vindo a suceder-se, a lei
continua a ser relativamente indiferente às diferentes formas de atribuição de
recompensas: note-se que, apesar de a
lei dizer claramente que a retribuição é uma contrapartida do trabalho desenvolvido,
a realidade é que não depende da produtividade mas apenas de disponibilidade da
força do trabalho: o trabalhador recebe, tão-só, por não faltar ao trabalho,
podendo, no limite, passar o dia de “mãos-nos-bolsos” – desde que não esteja a
incumprir nenhuma ordem da hierarquia da empresa, nada lhe poderá ser apontado.
Note-se
que os prémios de produtividade – ou quaisquer outros benefícios que dependam
do alcance por parte dos trabalhadores de objectivos pré-definidos, não
estando, por isso, previamente garantidos - não constituem retribuição.
Tal acontece porque o legislador pretendeu impedir que os trabalhadores fossem
remunerados, tão-só, quando apresentassem resultados – ficando, desse modo,
sujeito, no que respeita à determinação da contrapartida do seu trabalho, aos
riscos inerentes à actividade empresarial.
Não
obstante, fiscalmente, não há qualquer incentivo a aumentos de produtividade,
pois que, qualquer prémio, comissão ou outra bonificação, tem o mesmo
tratamento fiscal que a remuneração – podendo atingir, no caso dos
trabalhadores mais produtivos, uma carga fiscal superior a 50% do montante remuneratório
(entre IRS e TSU). E se, antigamente, havia algumas válvulas de escape – nomeadamente,
nos pagamentos em espécie – a partir da entrada em vigor do Código
Contributivo, passaram a incidir contribuições sobre todas as componentes
salariais (retributivas ou não).
Este
quadro de referência apenas conduziu a que as empresas “aguçassem o engenho”,
passando a recorrer ao pagamento de remunerações clandestinas/não declaradas –
que vão do pagamento de remunerações «surdas» (bónus distribuídos em numerário)
até aos pagamentos via offshores – ou
ao pagamento de remunerações diferidas - como os seguros capitalizáveis ou as
opções/unidades de participação - que não são tributáveis no momento da sua
atribuição, estando sujeitas a tributação mais favorável (através de taxas
liberatórias) na altura do recebimento.
Trata-se
de um problema estrutural do nosso sistema legislativo e fiscal, que constitui
um desincentivo poderoso á produtividade e ao trabalho por conta de outrem.
Em conclusão: seria desejável que o
tecido empresarial português apostasse em sistemas de incentivo á
produtividade, baseados em métodos de avaliação objectivos e pré-definidos. De
facto, é importante que o método de avaliação seja entendido como instrumento
de melhoria e desenvolvimento e que seja objectivo, transparente, justo e correctamente
aplicado por todos, contribuindo para alinhar o interesse de melhoria
organizacional com o desenvolvimento individual dos trabalhadores.
Só
assim – com uma cultura de rigor e exigência – é que o país terá o aumento de
produtividade global que lhe permitirá sustentar o nível de vida a que se
habituou. A alternativa é aquilo a que estamos a assistir: a perda acentuada de
poder de compra e a redução do nível de vida para níveis insustentáveis, de
acordo com aquilo que efectivamente produzimos. Este é um esforço a ser feito
pela comunidade empresarial, independentemente da intervenção do Estado. As
políticas estatais de “incentivo ao crescimento” através do investimento
público e incentivo ao consumo, se não forem acompanhadas por um crescimento
real da produtividade, não são viáveis. Daí que a intervenção do Estado, a
dar-se, terá de ser por via do levantamento das barreiras legislativas que
foram identificadas e do incentivo à concorrência. O país precisa disso.
Anexo A:
Bloom e Van Reenen, “Why do management practices Differ across firms and countries?”,
Jornal of Economic Perspectives, Inverno de 2010, pag. 203 -224. O
estudo baseia-se nos dados de um questionário rigoroso, mas simples, sobre as
práticas de gestão de cada empresa: As perguntas avaliavam a capacidade da
empresa de gerir informação interna, fixar metas, dar incentivos e recompensar
os trabalhadores com base no mérito e no desempenho. Cfr. questionário
reproduzido como anexo A.
Obviamente que nem sempre será assim e que todos os indivíduos assumem também
comportamentos altruístas (em prol de um bem comum, por exemplo) mas é, sem
dúvida, uma característica marcada de todas as pessoas.
Cfr. entre outros, BERNARDO XAVIER, Curso de Direito do Trabalho, 1992, pág. 382.
* Colaborador nas publicações do Blogue
desde Outubro de 2013.